A caçada
...Depois de satisfeita a condição básica, que era ter a
sua própria montada, condição primeira para poder acompanhar os outros homens da
aldeia nas caçadas. Depois de uma lição rápida, precisava adquirir algum
treino, para se ambientar ao cavalo e se possível para os acompanhar já na próxima
saída que iria acontecer dentro em breve. Reuniam um pequeno grupo que partia à
aventura embrenhando-se na serrania, longe do conforto e da segurança da vida
comunitária que tinham; normalmente faziam-no por dois ou três dias, chegando a
deambular pela serra mais de cem quilómetros como se descrevessem uma enorme circunferência
cumprindo os trezentos e sessenta graus, montando armadilhas em sítios já
pré-determinados. Nem sempre o azar lhes batia à porta, por vezes tinham sorte,
quando faziam a ronda e encontravam lá algum veado ou um ou outro javali, quando
isso acontecia era uma festa, pois raramente os conseguiam observar, mesmo ao
longe. Os homens da azinhaga haviam-se tornado caçadores desajeitados mas mesmo
assim caçadores, lembrando a pré história, tinham algumas armas de fogo, mas a evidente
escassez de munições, fazia com que só as utilizassem em ultimo caso,
preparados para a eventualidade de poderem vir a serem atacados por desconhecidos
ou então por alguma alcateia esfomeada, que no caso de aparecer virariam presas
num ápice em vez de predadores exímios; de resto utilizavam bastões de madeira
e cordas que eles mesmos começaram a fabricar com plantas locais.
Chegou a hora da partida, Artur imitando os
restantes, pegou nas suas coisas mas sem que primeiro se ir despedir da mulher
e dos filhos, que ficaram a choramingar, de forma mais sentida o filho João,
esse também queria ir. O pai prometeu-lhe baixinho que qualquer dia o levaria
também. Perante a promessa sorriu com a vitória alcançada, vendo a lágrima
acastanhada seca pela manga da camisola rota, que corria de forma abundante pelo
rosto sujo do filho. Ficou a pensar naquele rosto que ainda meses antes frequentava
o melhor colégio de Coimbra e agora sujo de pó de andar a brincar com os outros
miúdos suado e sujo, quem diria que era a mesma criança, quando antigamente
ficava horas sentado em frente de um computador, agora corre livremente atrás
dos cavalos. Perante estes pensamentos, sentiu-se confuso com o que seria
melhor para o seu filho, o que o faria mais feliz, se viver enclausurado pela
“etiqueta” ou andar livremente pelos montes a baixo atrás de cabras.
Pegou nos binóculos que tinha trazido consigo e numa
navalha, que utilizava desde o tempo de escuteiro quando ia acampar, ou então
um pouco mais tarde quando ia pescar com os amigos. Tinha-os guardado numa
bolsa de cabedal, ciosamente escondidos na sela do cavalo, chapéu e uma corda enrolada
ao ombro, e uma pequena manta atravessada nas costas do cavalo, fazia sentir-se
um autêntico “Cowboy”, lá foi todo contente na cauda do pequeno grupo,
observando.
Como que obedecendo, a um ritual o grupo seguia em
silêncio em direcção à serra, afim de inspeccionarem o terreno e claro as
armadilhas previamente montadas. Como que mecanizado o seu irmão Francisco
levantou a mão e todos automaticamente pararam; pressentiu algo, todo o grupo
parou, escutando. Em silêncio absoluto saltou do cavalo, agachou-se junto duns
penedos existentes no local. Repentinamente desatou numa correria sem freio. Um
ou dois minutos depois, voltou desconsolado dizendo era um coelho.
- Na volta
havemos de o apanhar, desgraçado estava a rir-se de mim, com as orelhas arrebitadas no ar.
Vamos embora!
1 comentário:
SÓ MAIS UM PASSO
Uma mãe sai às ruas
A enfrentar tiranias
A exigir respeito e liberdade,
Mesmo que tardia.
Cacetetes cobrem-lhe o corpo
Socos e pontapés em seu rosto;
Armas lhe são apontadas
Cuspindo fome e desorganização.
Em seu colo, uma criança,
Assustada, sem futuro,
Sem educação, vazia de esperança;
Vítima de líderes sem pátria.
Destemida a mãe avança contra as tropas
Abrindo brechas, ouvindo ameaças
Enfrentando tanques, abrindo trincheiras.
... Só mais um passo.
(Agamenon Troyan)
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